João Carlos Antunes
Apontamentos da Semana...
NA TERÇA-FEIRA, 5 DE NOVEMBRO, o dia até que estava a correr bem. Um Sporting a defrontar um dos maiores da Europa, num desafio épico que vai ficar na memória dos adeptos, como ficaram os cinco que deu há muito muito tempo (1964) a outro Manchester, o United. Com o golo madrugador do City, pensei que a coisa estava perdida, nisto de futebol sou homem de pouca fé, e desliguei por meia hora. Não sou o único sportinguista que reage desta forma. Creio que o embaixador Seixas da Costa sofre do mesmo mal e lembro sempre o Eduardo Prado Coelho que assumia a irracionalidade (e se há irracionalidade, é no mundo do futebol) da sua superstição: convencido de que o Sporting, perdia sempre que via o jogo na televisão, simplesmente deixou de ver. Neste caso, os deuses do futebol quiseram uma saída em grande e aos ombros do Ruben Amorim. Boa, isto é um bom prenúncio para a noite eleitoral americana, pensei eu. O que faz a felicidade de ter a equipa favorita a ganhar…
Os sinais dos primeiros números eram contraditórios, mas já a apontar para a vitória de Trump. Com uma ténua esperança me fui deitar e a primeira coisa que fiz ao acordar foi ler a informação mais recente no telemóvel. Com os piores augúrios a cumprirem-se. Fiquei mesmo frustrado e preocupado. Já com a certeza de quem seria o vencedor, lá fui continuar a faina azeitoneira. Mas a antecipação dos 4 anos em que iria suportar aquele figurão nos media, distraíram-me e acabei a atropelar com o trator o varejador mecânico que ficou para sempre incapaz de cumprir a sua tarefa. Por culpa do Trump, claro está. Um parênteses para estranhar os comentadores que agora desataram a dizer que o resultado era o esperado, que a Kamala era fracota, nem vai merecer uma nota de rodapé na história da América. Agora até já dizem que não se quis entender o povo, o que o povo queria, fechados na nossa bolha mediática. A esses eu apenas digo que a história da bolha vale para os dois lados. E que não era um problema de bolha. Era uma questão de convicções. E essas, podem rebentar todas as bolhas, vão continuar. E é bom lembrar a História: também foi o povo que, em janeiro de 1933, colocou Hitler no poder na Alemanha.
A frustração foi aliviada pelas tibornas em azeite novo, ligeiramente picante, a fazer-me recuar até aos tempos de criança, quando as melhores tibornas, pão torrado mergulhado na tina que recebia em bica o azeite acabado de fazer, eram feitas num dos três lagares que funcionavam na aldeia. Um dos lagares era semi-industrial, impessoal, não dava; o outro tinha um mestre mal encarado que não dava confiança à miudagem e havia o terceiro, o mais velho, que aceitava de braços abertos quem quisesse fazer uma tiborna ou comer uma bacalhoada.
E no final da semana, já conformados, aninhámo-nos na música. Na sexta, na Covilhã, com os Tinderstics e no sábado, a fechar o Dia dos Sinos, no auditório da Fábrica da Criatividade, que encheu para ouvir o magnífico Convite de um Miguel Carvalhinho desconcertante na guitarra de 10 cordas e na viola beiroa, em duo com a clarinete de Pedro Ladeira. Um espaço cénico concebido pela equipa da Fábrica da Criatividade a fazer jus ao nome e que incluiu a arte ilustrativa de Horácio Carvalhinho. Dois tipos de música diferente, em comum as deslumbrantes paisagens sonoras introspetivas que nos ofereceram.