José Dias Pires
ESECB: A MEMÓRIA DO QUE LÁ VIVI E O QUE NOS ARRISCAMOS A PERDER
Escrevo sobre o que vivi numa instituição que me fez amar, ainda mais, a educação e o ensino. A educação na sua vertente global - educação social e comunitária, o mesmo é dizer: educação escolar; educação social; educação cultural; educação empresarial e educação física e desportiva.
O ensino na sua vertente específica - ensino de técnicos para as várias vertentes educativas: ensino de educadores de infância e professores do ensino básico; ensino de técnicos de serviço social; de animadores culturais; de técnicos de secretariado empresarial; de técnicos de atividades físicas e desportivas.
Tudo isto fez e foi e é a Escola Superior de Educação de Castelo Branco - um passado presente e um presente futuro.
Escrevo do que sei, sem me deixar influenciar pelo que, de forma completa, ainda desconheço, apesar do que pude ler nos jornais ou me dizem alguns colegas e amigos.
Escrevo porque estou convicto que nenhum Instituto Politécnico, onde haja visão estratégica e perspetiva de futuro, pode prescindir da componente institucional e organizativa da formação no campo educativo, o mesmo é dizer: de uma Escola Superior de Educação.
Quando deixei a direção da ESECB em 2006 os alunos aí diplomados eram perto de 2900; eram 19 os professores doutorados e todos os docentes do quadro eram doutores, mestres ou realizaram provas públicas de aptidão pedagógica para as categorias de professor coordenador ou professor adjunto.
A ESECB tinha uma revista de investigação - “Educare Educere” - iniciada em Junho de 1995 com 18 números publicados (211 artigos - 103 de investigadores da ESECB; 83 de outros investigadores nacionais e 25 de investigadores internacionais.
Os docentes investigadores da ESECB tinham publicado, até então: 13 livros em editoras nacionais e 15 artigos em revistas internacionais.
Até essa data tinham sido realizados 22 grandes eventos na ESECB: 3 Congressos nacionais; 3 Congressos internacionais; 5 Encontros nacionais; 1 Encontro internacional (Ibero Americano); 2 Convenções nacionais; 6 Seminários nacionais e 2 Seminários internacionais.
Na época a ESECB participava em 4 projetos internacionais; tinha parcerias de formação especializada com a Universidade de Nothigham - Master of Supervision in Education; a Universidade de Lisboa - Mestrado em Tecnologias Educativas; e preparava-se para iniciar com a Universidade do Minho o Mestrado em Estudos da Criança - Educação Física e Lazer. Era a única escola da Península Ibérica que participava no Programa Europeu PROFILE (para formação de formadores no âmbito de dirigentes escolares europeus).
Em 2006 a ESECB tinha todos os cursos de formação inicial avaliados externamente muito positivamente e via um deles - a Licenciatura de Professores do 1º Ciclo do Ensino Básico - ser considerado como um dos melhores de todos os cursos avaliados no subsistema do Ensino Superior Politécnico.
Este invejável currículo seria muito enriquecido nos anos seguintes até aos dias de hoje, e determina que todos os que ali trabalharam e trabalham (espero que me deixem falar por eles) se sintam orgulhosos de ter sido capazes de responder, com qualidade, aos desafios que sempre tiveram de confrontar: o desafio científico e investigativo; o desafio pedagógico e didático; o desafio sociológico e o desafio cultural.
Todos estiveram sempre na linha da frente perante as propostas de mudança geradas no sistema educativo e às novas expectativas da comunidade educativa no que respeita a eficácia da escola, porque sabiam que, na verdade, a comunidade educativa é, simultaneamente, o nosso melhor fornecedor e o nosso melhor cliente. Fornece-nos a matéria-prima e adquire a nossa produção, mas não o faz de forma gratuita. Exige-nos correspondência às suas expectativas que são, sempre foram e serão, a aquisição de competências competitivas, objetivas, modernas, transformadoras e transformáveis, numa palavra: eficazes.
Na ESECB sempre se soube que só perante a avaliação da sua capacidade de resposta se estabelecia o valor do pagamento: o reconhecimento e a valorização da capacidade profissional e o apreço pela função social dos seus diplomados ou, por oposição, o desinteresse, a diminuição e a desvalorização do papel que eles podem ter na comunidade.
Quando dou comigo a pensar no que a ESECB representou para mim, há uma expressão que me ocorre de imediato: CULTURA ORGANIZACIONAL - a expressão das verdades da escola.
Cada escola tem a sua identidade e só quando ela for nítida e compartilhada pelas equipas técnico-administrativas e técnico-pedagógicas, pelos alunos e pais, é que será possível consolidar o clima institucional adequado às organizações proativas e inteligentes, que agem com consistência objetivada em resultados importantes, que são de médio e longo prazo.
O fundamental, então, para quem pensa em promover melhorias de qualidade do ensino, não são os modelos e as estratégias, em si mesmos, mas sim as pessoas e a cultura organizacional das escolas. As melhorias podem ser pequenas e pontuais; não há necessidade de grandes planos e projetos para se começar a respirar o novo clima. A “organização que aprende” melhora nos menores detalhes. O que a distingue das outras é exatamente a cultura de melhoria contínua por oposição ao apagar das memórias institucionais.
Admito que a qualidade de uma escola seja afetada pela qualidade de vida das pessoas envolvidas com ela, com a qualidade do clima institucional e do modo como se faz funcionar a escola.
Por isso, creio que é fácil entender que a concretização de uma cultura de melhoria contínua depende de requisitos específicos: um clima aberto, alimentado por interações constantes entre as pessoas; a procura da renovação, promovendo o acompanhamento e a interação com a sociedade e o Estado, tanto institucional, quanto individualmente; a questão da qualidade como exceção, que procura a diferenciação, a excelência e a superação de padrões; da qualidade como perfeição e consistência, que anula erros e defeitos, procurando acertar; a qualidade como capacidade de atingir objetivos, que se baseia na funcionalidade, atendimento e satisfação dos utentes, a qualidade como boa utilização dos recursos, que promove a prestação de contas, a adaptação às exigências e necessidades sociais, procurando a eficiência e a transparência e, por fim, a qualidade como poder de transformação, que promove a mudança provocada em alunos, professores, funcionários, e que estimula a análise e a crítica.
Os Institutos Politécnicos, tal como o Ministério da Educação e os sindicatos, obrigam-se a estar preparados para os novos desafios que hão de aparecer-lhe quando dentro de pouco anos as escolas públicas estiverem a deparar-se com o problema da falta efetiva de professores, e saber se são capazes de responder a perguntas tão antigas como estas: O que faz o professor ao ingressar na docência? Ao deparar-se com os problemas e dificuldades, a que recursos teórico-práticos recorre ou cria para tomar decisões que possibilitem a sua superação? Que características, orientações ou modelos precisam procurar ou desenvolver para iniciar o seu trabalho? Até que ponto a formação inicial pode contribuir para desencadear a construção de uma atuação comprometida com um ensino de melhor qualidade?
A ESECB, tal como todas as Escolas Superiores de Educação, está capacitada para responder a tais questões.
Estas as razões porque estou convicto que nenhum Instituto Politécnico, onde haja visão estratégica e perspetiva de futuro, pode prescindir da componente institucional e organizativa da formação no campo educativo, o mesmo é dizer: de uma Escola Superior de Educação.