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31 de julho de 2019

Carlos Semedo
ALTERIDADE

Começamos a perder ao berlinde
e acabamos a perder pessoas,
e tudo acontece tão depressa
como o intervalo para recreio na escola
quase não deu para jogar à bola.

[Raquel Serejo Martins em Os invencíveis, Poética Edições]

Hoje, tudo acontece muito depressa. Tanto e tão depressa que, por vezes, só o Google ou o Facebook nos ajudam no exercício outrora simples, de lembrar o que se passou há uma semana. A acumulação de acontecimentos, este rodopiar de momentos mobilizadores de atenção fugaz, tem um efeito tremendo na nossa capacidade de escutar o outro. Escutar o outro é uma das possibilidades mais fecundas para podermos aspirar a uma inscrição de acontecimentos na nossa vida.
O outro impede-nos de ficar fechados na nossa representação e só esse confronto permite que aspiremos à construção de um Eu mais equilibrado.
Este meu texto tem como epígrafe um magnífico e deslumbrante poema de Raquel Serejo Martins, que nos lembra de algo que nos une irremediavelmente enquanto seres humanos. Este prelúdio surgiu-me a propósito da iniciativa Sábados Contados, que decorreu mais uma vez, em diversos espaços públicos da cidade de Castelo Branco, uma parceria da Autarquia local com uma Associação em residência na Fábrica da Criatividade.
O princípio não poderia ser mais simples: um contador de narrativas orais e o público encontram-se no final de tarde e são usadas as ferramentas ancestrais para a comunicação, a voz e o corpo. Por vezes, um instrumento musical, livros, acessórios que ajudam a reforçar o poder da voz e da sua expressividade. É verdade que os locais são escolhidos com critério e ajudam na criação de um ambiente propício à proposta. Jardim do Paço, Parque da Cidade, Miradouro de S. Gens e antiga Rua do Saco foram os espaços usados na edição deste ano.
Muitas pessoas aderiram a esta iniciativa, em número que aumenta todos os anos. É um público diversificado na sua proveniência social e de todas as idades, com as famílias a terem um papel de destaque. O que leva tantas pessoas a sentir uma ne- cessidade tão forte de escutar histórias sem mais artifício do que a capacidade de o Homem de comunicar? Estou cada vez mais convencido de que é uma necessidade profunda de intimidade com a voz do outro, aliás julgo que posso afirmar as vozes do outro. Essa polifonia, crédito às qualidades dos contadores de histórias, reforça a intensidade da experiência. É, também, a necessidade de um outro tempo, feito de ritmos diversos, de silêncios, entoações coloridas, onomatopaicas e de ver, olhos nos olhos. O corpo, na sua fragilidade e força, aproxima-nos.
Não resisto a contar o que se passou numa das sessões, quando um dos contadores nos deslumbrava com a velha história do Rei e das tentativas de os pintores da Corte em concretizarem um retrato que contentasse a imagem que o nobre tinha de si próprio. Depois de duas tentativas falhadas, que resultaram na morte dos pintores e quando os outros candidatos já tinham fugido, eis que surge um jovem estudante que resolveu arriscar e pintar o Rei. Nesse momento da história, um espontâneo aproxima-se e senta-se na cadeira onde o Rei posava. O contador, surpreendido, não vacilou e interagiu de tal forma que grande parte do público presente, pensou que fazia parte da encenação. No final, os dois sacos de ouro foram “entregues” ao espontâneo, ficando um sorriso imenso em todo o público.
Cada vez mais, precisamos de acontecimentos com esta dimensão e tempo, que nos aproximem dos outros e nos permitam escapar à armadilha da aceleração e acumulação.

31/07/2019
 

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