Escrevo-lhe pois desconfio que o senhor é boa gente pois até gostam de si lá em Bruxelas. Em primeiro porque é doutor das finanças e diz-me o meu pai que doutor das finanças é o arquiteto principal dos orçamentos. Em segundo porque o senhor também é como eu a bem dizer assim elegantemente forte. Em terceiro porque o seu nome tem tudo a ver com as contas e em último porque só o senhor pode explicar porque é que eu levei uma bofetada quando gritei a palavra eureka depois de ter descoberto a melhor maneira de gastar a moeda que me tinham dado para o projeto de economia que nós temos andando a desenvolver lá na minha escola. Não merecia. Também o Arquimedes que era uma espécie de matemático lá na Grécia onde ele vivia inventou a palavra eureka e dizem que ele é um génio da matemática e eu levei uma bofetada? Isso é sinal de mau génio de quem ma deu ou não acha?
Vou contar-lhe a minha aventura: lá na escola o nosso projeto é de economia e a nossa professora disse-nos para fazermos uma experiência comercial com contas em que a moeda eram pastilhas elásticas. Por isso deu ordem no bar da escola que fazia de banco para nos darem dez pastilhas a cada um dos onze membros do nosso grupo e nós tínhamos que fazer comércio uns com os outros tentando fazer o melhor negócio e ganhar o maior número de dinheiro sem gastar as pastilhas todas até porque no fim tínhamos que pagar a dívida ao banco não sei se está a ver que era o bar da escola e ainda ficar com algumas pastilhas para nós.
A nossa professora armou-se em economista e pôs na papelaria à venda por oito pastilhas umas coisas que ela acha que nos interessavam para o negócio depois cada um de nós tinha que lá ir comprar o que mais gostasse e vendê-lo se fosse capaz aos outros mas fazendo bem as contas. Ciganada é o que é! Eu fiquei a pensar nisso e para não me deixar enganar fui comendo uma pastilha. O pior é que sou muito pensadora e pensei mais sete vezes no novo projeto da matemática e quando dei por isso estava tramada porque só tinha dois dinheiros.
Mas como a professora nos tinha ensinado e bem que às vezes os papéis podem ser transformados em vales que valem dinheiro e em cheques se tivermos palavra e vergonha. Ora como eu sou muito conversadora mas também sou envergonhada cheguei-me ó Chico Tecla Três que tinha comprado um cromo do Cristiano Ronaldo e comprei-lho. Pediu-me dez moedas de pastilha e como eu não tinha pastilhas que chegassem escrevi um papel onde pus que era um cheque que valia dez pastilhas no bar. Valem mesmo? Perguntou-me ele. Amanhã vais ó bar e trocas se queres ver. E ele quis e vendeu-me o cromo. O Chico pensou então que já podia comprar a carica da coca cola da Mena Fitas porque com o meu cheque já tinha de novo dinheiro e passou-lhe o meu cheque com a mesma conversa e a Mena comprou a bolota vermelha ao Pipas e o Pipas comprou o lápis chapado à Vesga e a Vesga comprou o porta chaves à Liças e a Liças a borboleta enlaçada ao Vitinho. Tudo com o meu cheque que eles já tinham gastado oito pastilhas cada um. E o Vitinho comprou o pente azul à Berta e a Berta fez negócio com a Ruça ficando com a orelha do Topogígio. A Ruça que desejava ter a joaninha de borracha da Vitória passou o tal cheque que agora já não era meu ou era? E a Vitória comprou a caixa de cartão em forma de volante ao Miguel. O Miguel andou a ver de mim para me comprar o cromo do Cristiano Ronaldo mas ainda bem que não me encontrou porque quem ficou entalado foi ele por não saber fazer as contas.
Bem não ficou logo entalado porque o bar já estava fechado mas na segunda feira quando lá foi é que ficou a saber que o meu cheque ou vale ou lá o raio que o parta era uma tanga pois quis usá-lo para pagar a dívida ao banco que era o bar não sei se está a ver e o cheque não tinha cabelo. Pois não tinha eu é que tinha comido oito pastilhas e ficado com o cromo de Cristiano Ronaldo e juro que hei de vendê-lo por dez pastilhas. Também já me dói a barriga e imagine o Miguel que ficou a arder com dez pastilhas. Bem o Miguel até é um gajo fixe e foi falar com os outros e disse-lhes: ó meus ou vocês arranjam maneira de pagar as pastilhas ou estão tramados porque eu quero de volta a minha caixa de cartão ou então cada um de vocês pagam uma pastilha por conta e mesmo assim ainda ficam a ganhar porque têm uma coisa que vale dez e mais uma pastilha que ainda sobra logo têm doze pastilhas talvez acho eu disse ele que sabia de matemática.
Os outros porque acham que o Miguel é muito inteligente e têm razão porque até é lá pagaram uma pastilha cada um em vez de devolverem o que compraram e o Miguel lá foi pagar o que devia ó banco. Depois foram ó bar beber um sumo à minha saúde porque eu os tinha burlado ao inventar o papel moeda e eles tinham continuado a mesma ciganada. Ora essa é que é a questão porque depois quando a professora quis saber como estava a correr o projeto estavam todos contentes e até eu principalmente porque tinha comido oito pastilhas e comprado o cromo do Cristiano mesmo sem ter dinheiro de verdade isto é pastilhas.
Tu pensas que és esperta menina Celinha disse a professora porque afinal achas que foste tu que criaste lucro a toda a gente e até ao banco que era o bar não sei se se lembra? e eu disse eureka e foi aí que levei a bofetada.
Ora bolas! Eu gostava que me explicasse o que o meu pai que trabalha num banco me disse quando me queixei da bofetada: deixa lá Celinha tu é que criaste a liquidez dos outros porque sabes fazer contas. Isso dos líquidos eu acho que é uma tanga porque no fim quem chorou fui eu que até fiz chichi pelas pernas abaixo tal foi a vergonha porque passei só por dizer eureka. O pior foi à noite porque me aconteceu o mesmo mas de tanto rir porque no telejornal deram uma notícia quase parecida com a minha história mas que era de um cheque sem cobertura e o senhor jornalista até justificou a história dizendo que nos tempos que correm a política de preços fixos nos negócios cria a ilusão de que as mercadorias possuem um valor intrínseco e os cheques mesmo sem telhado ou lá essa história da cobertura são como a termodinâmica onde é sabido que a informação possui valor matemático energético e como na história do Demónio de Maxwell se transformam num break-even matemático para os comerciantes. Não percebi nada mas pronto. Boa!
Afinal senhor Doutor Centeno arquiteto das finanças o que é que eu sou? Uma termodinâmica? uma cabeleira de cheques carecas? ou um demónio com saias que é dona do cromo do Cristiano Ronaldo e tem oito pastilhas no bandulho e mesmo assim fez andar a economia porque sabe matematizar a vida?
O meu pai diz que eu vou longe e sendo assim vou até ao largo do centro comercial não acha? Adeus.
Agora só volto em janeiro do ano que vem.
Até lá.

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