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12 de setembro de 2018

Antonieta Garcia
“ENCONTRAMO-NOS PARA UM CAFÉZINHO…”

As promessas que envolvem esta frase são sedutoras. Adivinha-se um desejo de conversa, o desenhar o início de um projeto, uma reflexão, um comentário…coisas que interessam a quem há de partilhar o encontro.
Lugar de excelência da comunicação, o “café” é a bebida identificadora do espaço… É elucidativa a lenda da bebida escurinha. Um monge passeava pelas pastagens da Arábia. Ao longe, no local onde pastavam cabras percebeu que havia algazarra. Aproximou-se. Viu nas mãos do pastor uns frutos vermelhos, e soube que o consumo dos bagos era responsável pela vitalidade do gado; caminhava quilómetros, fresco, sem descansar. Curioso o monge levou os bagos miraculosos para o mosteiro. Experimentou o sabor e a noite inteirinha orou, orou, orou, sem sono… Os períodos de preces e de meditação alongaram-se… Deus seja louvado!
Mil anos depois de Cristo, os árabes faziam uma tisana fervendo os bagos. No século XIV, desenvolvido o processo de torrefação, a bebida ficou semelhante ao cafezinho que hoje nos delicia. A partir de 1900, o consumo popularizou-se, os cafés multiplicaram-se. George Steiner considera-os marcadores relevantes da identidade europeia. Não esquece, o Martinho da Arcada associado às artes e letras portuguesas; Fernando Pessoa elegeu aquele espaço como seu. Acresce que o mesmo Poeta, hoje, espera-nos na “Brasileira”, para tomarmos uma bica, a seu lado.
Lugar com alma Steiner comenta que “O café é um local de entrevistas e conspirações, de debates, de mexericos (...). Aberto a todos, é todavia um clube, uma franco-maçonaria de reconhecimento político ou artístico-literário e presença programática... Na Milão de Stendhal, na Veneza de Casanova, na Paris de Baudelaire, o café albergava o que existia de oposição política, de liberalismo clandes­tino”. (George Steiner, A Ideia de Europa).
Na verdade, a sociabilidade, o convívio de intelectuais que seivam a cultura e lhe dão vida, realiza-se (ainda?) no café, nos cafés. Em torno de uma bica curta, frui-se uma pausa, busca-se um estimulante, reflete-se, estuda-se, namora-se, põe-se a leitura e a conversa em dia…
“Tomamos um café!” significa marcar um encontro desejável, para tudo. Bebida mágica torna filósofos frequentadores, proprietários e funcionários. Os verdetes de estimação, as intrigas, as desavenças locais cumprem a ordem do dia da má-língua. Os clientes habituais merecem especial atenção, nos cafés antigos e nos modernos.
- Traga-me… um carioca de café.
- Já?
- Como assim?
- Sabe? Aos 20 anos, pedem bicas duplas; aos 30/ 40, querem bica curta; segue-se o café; o café cheio; passam ao carioca e chegam ao descafeinado… Pois é…
- Quero um café, rápido!
- Para quê a urgência? Vai passar aí o resto da tarde… Tenha calma que ainda é muito novo!
O jovem não gostou da resposta. Elegeu, porém, o silêncio… Esperou com o tablet em riste, pela bebida, e agradeceu ao funcionário.
Nesta narrativa, algo mudou, está bem de ver; entre a gente nova, poucos leem o jornal em suporte de papel, a cerveja disputa o lugar primacial ao cafezinho mimado. Depois dos cafés-concerto, cafés-tertúlias, vieram o bar e o lounge… Mas ali, sentados muito confortavelmente, ninguém fala com ninguém. (É melhor perder-se frente a um ecrã? Que culto é este? A que deuses?)
No café, continuam os namoros. Muito calados. Veem imagens e textos. Cada um escolhe o que gosta? De vez em quando, mostram qualquer coisa um ao outro. E regressam à companhia da maquineta… terrivelmente sós. Um beijinho à chegada, outro à despedida… Também há os muito apaixonados, sem apoio tecnológico, e com felicidade para dar e vender . Contam-se pelos dedos da mão, mas é tão saudável esta diferença... Porquê? Ao menos, autoriza a que limpemos teias de aranha à nossa memória.
Pedia um amigo, sorrindo:
- Queria um café…com bons modos!
Lá está! Também aparecem baristas (novíssima profissão de quem aprendeu a servir café), com pouca paciência e não custa nada ensinar com calma. Aquela bebida, naquele dia, terá sido caprichada?
Na Beira, o café foi espaço masculino, ia adiantado o século XX. Alguns, batizados de “Salão de chá”, ou “Leitaria” … instituíram-se como lugar-comum, para o género feminino. No Fundão, talvez a natação, os festivais, as revelações de jovens fundanenses, em provas regionais e nacionais, tenham influenciado as vanguardistas. Porque, sobretudo, desde os anos 50 do século XX, as ditas jovens vestiam fato de banho, usavam calças, frequentavam cafés… pecados maiores noutras cidades da Beira.

12/09/2018
 

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