Fernando Raposo
Vem aí novamente a Guerra Fria?...
Os dias que antecederam a reunião dos ministros das Finanças do Eurogrupo, a 18 de Junho, no Luxemburgo, foram de tensão exacerbada entre a Grécia e os seus credores: acusações mútuas, insultos e ameaças, que tornam mais difícil alcançar uma solução que satisfaça ambas as partes.
Este braço de ferro arrastou-se por demasiado tempo. Passaram cinco longos e penosos meses, sobretudo para os gregos, e, seja qual for, neste momento, a solução, acentuar-se-á ainda mais a desconfiança dos cidadãos face à Europa.
A vitória do Syriza e a consequente derrota dos partidos que governaram a Grécia são a expressão da revolta do povo grego face às medidas austeras que lhe foram impostas. Os gregos disseram não às imposições unilaterais e inegociáveis da Troika e que parecem ter a intenção de “esmagar” a democracia.
As instituições e os responsáveis Europeus não compreenderam tal facto e não se têm poupado a esforços para continuarem a ignorar o significado das últimas eleições na Grécia. Seguiram o pior caminho ao “afrontarem” novamente o povo grego, continuando a exigir-lhe um esforço sobre-humano. Esta exigência tem sido interpretada como vingança e represália por o povo grego ter tido a “ousadia” de democraticamente ter feito outra opção que lhes escapa, em termos de submissão e subserviência.
Também como por cá, a Grécia assistiu à partida dos mais jovens e dos mais qualificados. O desemprego disparou ainda mais, atingindo já os 27%, os salários caíram 37% e as pensões foram reduzidas, conforme palavras do Ministro das Finanças Grego, até 48% e o número de funcionários diminuiu abruptamente (30%). Apesar de todo este esforço, a dívida pública ultrapassa agora os 180%!
Então para que raio serviu o ajustamento?
À Europa, impunha-se-lhe ser a primeira a evitar que as medidas fossem interpretadas pelos cidadãos europeus como um castigo, uma pena ou até como vingança.
De nada vale “apontar o dedo” aos gregos ou mesmo a nós, portugueses, pelos erros que se cometeram. Ninguém está isento de culpas e aqueles que dizem agora que os alemães não têm de pagar pelos erros dos gregos deveriam ter-se lembrado disso antes, quando lhes impingiram uma “catrefada” de submarinos que agora estão algures por lá encalhados. O povo grego está a pagar por isto e também pelo dinheiro sujo usado para untar as mãos dos corruptos envolvidos na negociata.
Estão também, certamente, a pagar pela abertura do seu mercado a outros povos em que a mão de obra é escravizada e paga a meia dúzia de patacos. Países em que os direitos sociais, e mesmo humanos, são ignorados e para onde muitos empresários, ditos europeus e civilizados, deslocalizaram as suas empresas, apenas movidos pela ambição do lucro.
Pois! É a globalização, estúpido!
À hora em que ultimo estas notas, ainda não se vislumbra fumo branco, a não ser algum zunzum mais optimista para animar os mercados.
Das partes envolvidas na contenda, em particular da Alemanha, espera-se uma atitude sensata e sábia, que evite humilhar o povo grego.
A paz na Europa e em todo o ocidente é um valor precioso que não pode ser esfumado pelo deslumbramento do poder da Alemanha e dos países mais ricos do euro e pela teimosia, senão mesmo obsessão do equilíbrio orçamental.
Se do desfecho resultar a capitulação da Grécia, os mais extremados, sobretudo os que defendem a saída do euro e da união, sentir-se-ão reforçados nos seus argumentos e as consequências daí decorrentes poderão significar um custo muito elevado para os gregos e para todos os europeus.
Enquanto a coisa não desata, Vladimir Putin esfrega já as mãos de contente por uma eventual saída da Grécia da Nato, enquanto Barack Obama, do outro lado do mundo, treme que nem “varas verdes”, receoso de não conseguir dissuadir os seus aliados europeus a destruir a teia em que se deixaram enlear.
Vem aí novamente a guerra fria?...